PL 422/23 – Combate ao racismo religioso
Adota políticas de combate ao racismo religioso
26 jun 2023, 16:21 Tempo de leitura: 7 minutos, 31 segundosAdoção de políticas de combate à estigmatização das religiões de matriz africana e de prevenção e enfrentamento da violência sofrida por seus praticantes, símbolos e lugares de culto.
As religiosidades fazem parte da história da humanidade.
Nosso país tem uma mistura de diversas religiões, que integram a nossa origem e história. É preciso que o Estado proporcione políticas públicas, para que todos os brasileiros e brasileiras tenham o direito de praticar a sua fé.
As religiões de matriz africana sofrem constantemente ataques preconceituosos e precisamos dar um basta nessa discriminação sofrida por seus praticantes.
Que todos tenham o direito de praticar a sua religiosidade!
Veja a íntegra aqui:
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
GABINETE DO(A) DEPUTADO(A) PROF JOSEMAR
PROJETO DE LEI Nº 422/2023
INSTITUI O PROGRAMA ESTADUAL DE
COMBATE AO RACISMO RELIGIOSO.
Autor(es): Deputado PROF JOSEMAR
A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
RESOLVE:
Art. 1º Esta Lei institui diretrizes e ações para a criação do Programa Estadual de Combate ao
Racismo Religioso, que tem como objetivo a adoção de políticas de combate ao racismo
religioso e à estigmatização das religiões de matriz africana e de prevenção e enfrentamento
da violência sofrida por seus praticantes, símbolos e lugares de culto.
Art. 2º Para os fins desta Lei, considera-se racismo religioso toda e qualquer conduta
praticada por agente público ou privado que resulte na discriminação, restrição ou violação de
direitos coletivos ou individuais dos praticantes de religiões de matriz africana.
Art. 3º O Programa Estadual de Combate ao Racismo Religioso tem como diretrizes:
I – promover os valores democráticos da liberdade religiosa e da laicidade do Estado, bem
como do nexo entre elas, como parte de uma cultura de integral respeito aos direitos
humanos;
II – articular os diferentes órgãos públicos competentes para fazer cessar violências e
discriminações religiosas de cunho racista e responsabilizar os agressores;
III – reconhecer expressões de racismo e outras práticas de ódio em formas religiosas, e sua
diferenciação da liberdade religiosa, inclusive no serviço público.
Art. 4º É garantido aos praticantes de religiões de matriz africana, independentemente de raça
ou etnia, sem prejuízo dos outros garantidos em lei:
I – o direito a tratamento respeitoso e digno;
II – a prática e a celebração de seus rituais, em lugares privados ou públicos, observadas
apenas as regulamentações administrativas nos exatos limites em que aplicadas a outras
religiões ou reuniões de caráter não religioso;
III – o uso de vestimentas e indumentárias características, em lugares abertos ou fechados,
públicos ou privados, inclusive solenes;
IV – o direito de levarem consigo para práticas e celebração de rituais, resguardados de
qualquer constrangimento, crianças e adolescentes que sejam responsáveis legais, que tenham
a guarda de fato ou por cujo cuidado sejam responsáveis.
V – É assegurado a sacerdotes e sacerdotisas de religiões de matriz africana o acesso a
entidades civis e militares de internação coletiva, públicas ou privadas, para fins de prestação
de assistência religiosa na mesma forma e condições conferidas a sacerdotes de outras
religiões, nos termos do art. 5º, VII, da Constituição da República.
§ 1º A denúncia de violação de direitos de criança ou adolescente formulada contra seus
responsáveis legais, ou contra as pessoas com quem a criança ou adolescente conviver, que
tenham como fundamento as práticas de religiões de matriz africana, sem indicação de
qualquer fundamento fático ou legal, ou com fundamento fático notoriamente falso, deve ser
considerada manifestação de racismo religioso e encaminhada para investigação pelas
autoridades competentes por possível cometimento das infrações previstas no art. 140, § 3º, e
art. 208 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, ou na Lei federal
nº 7.437, de 20 de dezembro de 1985.
Art. 5º A inobservância das garantias expressas no art. 4º acarreta:
I – para estabelecimentos comerciais e pessoas físicas, o pagamento de multa de 250 a R$
2.500 UFIR, a ser fixada conforme a gravidade e majorada em 2 vezes em caso de
reincidência;
II – para pessoas jurídicas de direito privado, o pagamento de multa de 5.000 a 25.000 UFIR
e, em caso de reincidência, suspensão das licenças estaduais de funcionamento por um
período de 2 anos, após o trânsito em julgado de processo administrativo;
III – para servidores públicos, instauração de procedimento administrativo disciplinar para
apurar responsabilidades pelo ato discriminatório ou ofensivo.
Parágrafo único. Em qualquer hipótese, a denúncia de descumprimento deve ser encaminhada
para as autoridades policiais para apuração das infrações previstas no art. 140, § 3º, e art. 208
do Código Penal ou na Lei federal nº 7.437, de 1985.
Art. 6º O Programa Estadual de Combate ao Racismo Religioso deve se realizar, no mínimo,
com as seguintes ações:
I – capacitação de servidores públicos ou de prestadores de serviços públicos,
prioritariamente aqueles que atendem o público, quanto ao dever constitucional de igual
respeito e tratamento aos praticantes de todas as religiões, bem como aos ateus;
II – veiculação de campanhas de comunicação social para conscientização quanto ao racismo
religioso e suas expressões mais comuns.
III – elaboração de estudo que identifique os registros públicos de violência contra terreiros
ou outros locais de culto de religiões de matriz africana, e posterior elaboração de plano de
segurança;
IV – fiscalização de denúncias do cometimento de infrações tipificadas nesta Lei e aplicação
das penalidades.
Art. 7º Para a execução das ações previstas no Programa de que trata esta Lei, podem ser
celebrados instrumentos de cooperação, convênios, acordos, ajustes ou termos de parceria
entre entes governamentais e entre estes e entes não governamentais.
Art. 8º As despesas decorrentes da execução desta Lei correm por conta de dotações
orçamentárias próprias ou suplementadas, se necessário.
Art. 9º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Plenário do Edifício Lúcio Costa, 14 de março de 2023
PROF. JOSEMAR
Deputado
JUSTIFICATIVA
As religiosidades fazem parte da história da humanidade e as religiões contribuíram para a
formação das sociedades por todo o globo e também da sociedade brasileira.
No mesmo sentido, a evolução do conceito de tolerância religiosa foi fundamental para a
consolidação do Estado Moderno e foi precursora das democracias liberais fundamentadas no
Estado de Direito.
Sendo assim, é impossível pensar o Brasil como Estado Democrático de Direito sem afirmar
a importância do sentido básico de tolerância religiosa: a garantia e respeito à prática de todas
as religiões em igualdade de condições e isonomia de tratamento, por parte do Estado, aos
seus praticantes.
Porém, o conceito de tolerância religiosa foi pensado a partir da necessidade de convivência
harmônica entre as religiões cristãs, sobretudo a religião católica, carismáticas e protestantes.
Sendo assim, o conceito de intolerância religiosa não inclui o elemento racial que fundamenta
a discriminação a todas as manifestações culturais, religiosas e sociais dos povos negros
traficados e escravizados do continente africano para o Brasil.
Essa incompletude no conceito de intolerância religiosa interfere no real diagnóstico do
problema discriminatório sofrido pelos praticantes das religiões de matriz africana. Pois,
esses atos não se resumem somente à intolerância contra uma religião ou outra, há manifesta
aversão às manifestações religiosas provenientes dos povos negros.
Essa aversão é fundamentada no racismo, ódio e no desconhecimento das práticas religiosas
de matriz africana. Sendo assim, é fundamental entender essa discriminação como racismo
religioso.
Conforme definição da cartilha Terreiros em Luta, racismo religioso é um conjunto de
práticas violentas que expressam a discriminação e o ódio pelas religiões de matriz africana e
seus adeptos, assim como pelos territórios sagrados, tradições e culturas afro-brasileiras.
Dados do Instituto de Segurança Pública (ISP) mostram que, em 2021, o estado do Rio
registrou aumento de 11,7% nos casos gerais de intolerância religiosa em relação a 2020. Em
2021, foram 1.564 ocorrências, contra 1.400 nos 12 meses anteriores.
Em 2022, essa casa aprovou o relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da
Intolerância Religiosa e incluiu 55 recomendações aos órgãos públicos para efetivar o
combate ao racismo religioso. Dessa forma, é fundamental o avanço legislativo no sentido de
municiar os órgãos públicos no combate a essa prática.
O Brasil, como signatário da Convenção Interamericana contra o Racismo, promulgada pelo
Decreto nº 10.932, de 10 de janeiro de 2022, tem dever de combater a discriminação racial e
todas as formas de intolerância.
Sendo assim, através da criação do Programa Estadual de Combate ao Racismo Religioso
será possível a adoção de medidas eficazes para a prevenção e combate à esses atos. Essa
iniciativa vai ao encontro de outras iniciativas dessa casa, como o Programa de Assistência às
Vítimas de Intolerância Religiosa, instituído pela Lei 9.212/2021.
Diante disso, solicito aos meus pares a aprovação do presente Projeto de Lei.